terça-feira, julho 13, 2010

Ao cuidado de Medina Carreira

NOTA: Esta mensagem foi reeditada. Alguns amigos, que fizeram o favor de a comentar, fizeram-me ver que o original não estava suficientemente claro.

Medina Carreira, conhecido pessimista profissional, fustiga-nos sistematicamente com as suas crenças, que, na maioria das vezes têm 20% de verdade, 20% de exagero, para reforço legitimo da mensagem e 60% de generalização ilegítima.

Um dos seus cavalos de batalha é o da educação. Para ele, a Escola de hoje produz ignorantes em massa.
E eu contesto!
A "quantidade" de conhecimentos que a generalidade da população hoje é detentora, é de longe muito superior, àquela de há 50 anos atrás:

1 - Conhecimentos escolares:
  • o ensino obrigatório passou da quarta classe para o 9º ano;
  • o número de alunos inscritos aumentou de 30 000 nos anos 60 para cerca de 400 000.
  • a taxa de escolarização aos 18 anos passou de 45% em 1991 para 62% em 2001 e a percentagem da população com nível de instrução médio e superior evoluiu no mesmo período de 6,3% para 10%.
  • a população entre os 18 e os 24 anos que não se encontra a frequentar qualquer grau de ensino registou uma evolução de 1991 para 2001 de 64% para 45%.
  • o número de doutorados triplicou nos últimos 10 anos.
É evidente que a democratização do ensino produziu um abaixamento de nível. Mas contesto que só hoje se verifiquem casos de licenciados ignorantes.
Se me apresentam casos pontuais, também eu rebato com casos pontuais: um engenheiro dos "meus tempos" simplificou uma fracção da seguinte forma, "cortando" o x em cima e em baixo:
(3+x) /x = 3
quando lhe chamei a atenção para o disparate, olhou para mim espantado: "Eh pá! Ainda te lembras disso?!!)

2 - Conhecimentos adquiridos fora da Escola

A evolução do modo de vida também transmite conhecimento.
De uma população fundamentalmente rural, passámos para uma população urbana. Na minha juventude, na quinta para onde eu ia de férias havia trabalhadores que nunca tinham visto o mar, e estavam apenas a 150 km.
Quem conduzia um burro e carroça, passou para o carro comprado a prestações.
Quem morava na casa de terra batida, passou a morar num T3 em Massamá.
Quem andava de pé descalço a cavar a terra, passou a andar calçado na Foreva e a trabalhar com um telefone e um computador à frente.
Quem ouvia o relato do Benfica na Emissora Nacional, passou a vê-lo na SportTV.
Quem nunca passava férias, hoje vai para Punta Cana.
Toda esta nova vivência forma conhecimento e traz novas perspectivas às pessoas.

Querem mais? Resolvi fazer um pequeno teste e comparar as competências do meu filho de 12 anos com as minhas na mesma idade.
De início as coisas estavam a meu favor: eu sabia os rios e as serras, as linhas de caminho de ferro, coisas que ele desconhecia completamente.
Mas, depois as coisas pioraram: Vejam o que ele sabe que eu não sabia:
1-escrever e falar razoavelmente inglês,
2-escrever um texto em word e fazer uma apresentação simples em powerpoint
3-retirar dinheiro de uma máquina multibanco;
4-pôr um vídeo no youtube
5-enviar sms para os amigos
6-ir ao menu "ferramentas" e clicar "Limpeza do Disco"
7-consultar a wikipedia
8-jogar o farmville

Já me fiz entender?
Hoje há uma quantidade de informação na cabeça dos portugueses incomparavelmente superior àquela que existia há 50 anos. Apesar da "alegada" degradação do ensino.

6 comentários:

Francisco Clamote disse...

Não me tinha ainda apercebido do seu regresso. Que saúdo. Saudações cordiais.

Eurico Moura disse...

Não podemos comparar o que não é comparável.
Nestes casos lembro-me sempre da resposta do puto a quem perguntam se gosta mais do pai ou da mãe, ao que ele responde: gosto mais de bife!!!
A questão que se põe é se o ensino a que foste sujeito te preparou para a vida e para o mundo do trabalho à época; parece-me a mim e a ti, suponho, que SIM. Se agora, e com o mesmo ensino, estarias preparado, é uma questão inútil. Seria o mesmo que questionar se Napoleão estaria preparado para dominar a Europa de hoje...

Eurico Moura disse...

Eu sei que detestas o M.Carreira. A mim também me falta a paciência mas devo reconhecer que quando andavam todos embalados pela cantigas do Engº Sócrates (um bom exemplo da democratização do ensino) foi o único que gritou "O Rei vai nu!" . Agora multiplicam-se as mesas redondas com prantos de pessimismo e até nas quadraturas o Costa começa a reconhecer os podres apontados pelo pessimista de serviço.
A nova versão do post não invalida o que disse no comentário anterior e os exemplos que dás apontam para uma realidade bem pobre: Massamá, Punta Cana, SporTV.... Balhamedeus!

Claro que cabe aos capos do regime dizer que este é o melhor dos mundos, mas deixem que a malta não acredite...

oscar carvalho disse...

Ah não! Não detesto o Medina Carreira! (Sinceramente eu até acho que não detesto ninguém!...)
O que não gosto é de ver pessoas cultas e inteligentes a serem pouco rigorosas, fazendo generalizações abusivas, tomando a parte pelo todo, recusando-se a ver o que se fez de positivo, apenas porque foi feito por alguém que, à priori, foi classificado como medíocre.
Outro que tal é o Pacheco Pereira!

Eurico Moura disse...

Aí estamos de acordo! Por isso é que temos de partir a informação que deles nos chega, em pequenos pedaços, e analizá-los, um por um, sem olhar ao todo do discurso nem ter em conta as personalidades que o proferem. O Pacheco diz coisas com que concordo e o Medina também. E uma coisa que o Medina diz e que os seus convidados, Nuno Crato, Carlos Fiolhais, etc.. confirmam, é que o nível dos conteúdos do ensino secundário oficial é pobre e que o grau de exigência da avaliação dos alunos sobre esses conteúdos ainda o é mais...
Será assim? Difícil para mim avaliá-lo pois não tenho qq hipótese de o saber. A minha experiência pessoal com jovens vai, na generalidade, no sentido contrário, mas dá para perceber que os jovens com que eu contacto tem muito mais cultura adquirida fora da escola do que nela...
Mas na generalidade não lêem livros, não vão a concertos para ouvir música (vão para curtir o ambiente), não vão ao teatro, não vão ao bailado, não vão ver cinema de qualidade e sobre tudo, não pensam sobre o que aprendem e sobre o que experimentam. Não têm tempo!
E isto não se apreende pelo contacto com os que nos estão perto. Basta frequentar esses fóruns de cultura...
Está melhor que no nosso tempo? Talvez! Poderia estar melhor? Concerteza!!!

oscar carvalho disse...

Estamos no essencial de acordo. Contudo, estou convencido que no ensino da música houve uma melhoria muito significativa, com MILHARES de jovens a aprender. (E claro que também outros tantos a gostarem de uma pseudo-música absolutamente intragável!!)
E que se perdoe ao pai babado, mas vou incluir um video do meu filho mais novo (12 anos).